Há poemas que têm uma forma fixa, isto é, submetida a regras determinadas quanto à combinação dos versos, das rimas ou das estrofes. Assim o soneto, o rondó, o rondel, a balada, o cantoreal, o vilancete, a vilanela, a sextina, o pantum, o haicai e a quadra popular. Dentre eles, merece um comentário particular o soneto por sua longa vitalidade em várias literaturas, inclusive na portuguesa e na brasileira.
O soneto
Há duas variedades de soneto: o soneto italiano e o soneto inglês.
1. Compõe-se o soneto italiano de quatorze versos, geralmente decassílabos ou alexandrinos, agrupados em duas quadras e dois tercetos.
As rimas das quadras são as mesmas. Um par de rimas serve a ambas, segundo um dos dois esquemas: abba-abba, abab-abab.
2. Nos tercetos podem combinar-se duas ou, mais frequentemente, três rimas.
Quando há apenas duas rimas, dispõem-se elas normalmente de forma alternada: cdc-dcd. Se as rimas são três, distribuem-se em geral nos esquemas:
1º) ccd-eed, empregado preferentemente por Florbela Espanca, a exemplo destes tercetos de Languidez:
Fecho as pálpebras roxas, quase pretas,
Que pousam sobre duas violetas,
Asas leves cansadas de voar...
E a minha boca tem uns beijos mudos...
E as minhas mãos, uns pálidos veludos,
Traçam gestos de sonho pelo ar...
2º) cdc-ede, que se documenta nos tercetos de Lar paterno, de Belmiro Braga:
Serras virentes, que não mais transponho,
Na retina fiel ainda eu vos tenho,
E revejo, através de um brando sonho,
A casa onde nasci, as mansas reses,
A várzea, o laranjal, a horta, o engenho
E a cruz onde rezei por tantas vezes...
3º) cde-cde, que aparece nestes tercetos de Zulmira, de Raimundo Correia:
Não sei porque chorando toda a gente,
Quando Zulmira se casou, estava:
Belo era o noivo... que razões havia?
A mãe e a irmã choravam tristemente;
Só o pai de Zulmira não chorava...
E era o pai, afinal, quem mais sofria!
Estas as principais disposições rímicas do soneto italiano, ou seja, da forma tradicional deste breve e afortunado poema.
3. O soneto inglês, modernamente introduzido nas literaturas de língua portuguesa, também consta de quatorze versos, mas distribuídos em três quadras e um dístico final, que se escrevem sem espacejamento. Obedece a um dos dois esquemas:
a) abab bcbc cdcd ee;
b) abab cdcd efef gg.
Na literatura inglesa, o primeiro tipo é conhecido por soneto spenseriano(spenserian sonnet), por ter sido cultivado inicialmente pelo poeta Edmund Spenser (1552?-1599); o segundo denomina-se soneto shakespeariano (Shakespearean sonnet) ou, simplesmente, soneto inglês (English sonnet) por se haver tornado a forma mais usual do poema desde que dela se serviu o genial dramaturgo nos 154 espécimes do gênero que nos legou.
De Manuel Bandeira é este soneto shakespeariano:
Soneto inglês no 2
Aceitar o castigo imerecido,
Não por fraqueza, mas por altivez.
No tormento mais fundo o teu gemido
Trocar num grito de ódio a quem o fez.
As delícias da carne e pensamento
Com que o instinto da espécie nos engana
Sobpor ao generoso sentimento
De uma afeição mais simplesmente humana.
Não tremer de esperança nem de espanto.
Nada pedir nem desejar, senão
A coragem de ser um novo santo
Sem fé num mundo além do mundo. E então
Morrer sem uma lágrima, que a vida
Não vale a pena e a dor de ser vivida.
Fonte: http://www.aulete.com.br/gram/cap20-05-poemas_de_forma_fixa